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17º CINE PE – conclusão em polêmica II

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Comédia anárquica de Betse de Paula triunfa de forma acachapante. Júri deu destaque excessivo a um só filme, quando a mostra era composta de títulos bons ou regulares. Sem nenhuma obra-prima

O documentário URÂNIO PICUI (2013), de Thiago Melo

O documentário URÂNIO PICUI (2013), de Thiago Melo: ignorado por 2 júris

MARIA DO ROSÁRIO CAETANO
Especial de Recife

Concentração semelhante de prêmios só aconteceu no Cine Ceará (2003), que despejou todos os seus troféus em Amarelo Manga. O belo curta pernambucano Urânio Picuí, com arrebatadora fotografia de João Carlos Beltrão, foi ignorado pelos juris oficial e paralelos.

JURI – CONCENTRAÇÃO ABSURDA I

Em 1985, o júri do Festival de Brasília atribuiu a maioria de seus prêmios ao longa A Hora da Estrela, de Suzana Amaral. Só três troféus Candango foram parar  fora da equipe artística e técnica da adaptação lispectoriana. Houve grita na imprensa especializada??? Não. As qualidades do longa de estréia de Suzana eram realmente muito superiores às qualidades dos concorrentes. Em 2003, no CineCeará, um  desatino: todos os prêmios foram parar nas mãos de Claudio Assis e equipe, por Amarelo Manga, filme que meses antes vencera o Festival de Brasília. E na competição havia títulos de reconhecida qualidade (caso de Narradores de Javé, de Eliane Caffé, que colecionou prêmios em festivais nacionais e internacionais, e Seja o Que Deus Quiser, de Murilo Salles).  Só dez anos depois desatino semelhante acontece num festival brasileiro: o juri do CINE PE (formado pela atriz Paula Burlamaqui, o fotógrafo Pablo Lazzarini, o cineasta Beto Souza, a gestora cultural Ruth Albuquerque, o diretor de TV José Luiz Villamarin, o produtor Marcus Ligocki Jr e o jornalista Cleodon Coelho) resolveu jogar todas as  fichas num único filme: a comédia anárquica Vendo ou Alugo, de Betse de Paula. O fascínio que o filme exerceu sobre os jurados merece análise pormenorizada.

João Miguel e Leandra Leal em BONITINHA MAS ORDINÁRIA (2013), de Moacyr Goes

João Miguel e Leandra Leal em BONITINHA MAS ORDINÁRIA (2013), de Moacyr Goes

JURI: CONCENTRAÇÃO ABSURDA II

Os jurados viram poucos méritos em Bonitinha mas Ordinária, o filme mais consistente do prolífico Moacyr Góes, uma adaptação para nossos dias da única peça com final feliz de Nelson Rodrigues (Bonitinha Mas Ordinária ou Otto Lara Resende). Com elenco de excelente qualidade: Leandra Leal, arrasando, Leon Góes na pele de um inesquecível Peixoto (não havia quem merecesse mais o Calunga de ator coadjuvante!!!), uma estreante promissora (Letícia Colin), Gracindo Jr, Lígia Cortez, Maria do Carmo e, claro, o grande João Miguel. Quase que o filme sai de mãos abanando. Foi salvo pelo grande ator baiano, excelente num personagem de alma carioquíssima, ex-office boy (contínuo), sempre de cerveja na mão e tentado por um cheque de 5 milhões (para casar-se com a Bonitinha violentada). Aceitar a grana ou seguir os rumos do pai, já falecido, homem honesto, que morreu pobre? Casar-se por causa da grana ou ficar com Ritinha, a mulher amada, que se prostitui?

RIO DOCE CDU (2012), de Adelina Pontual

RIO DOCE CDU (2012), de Adelina Pontual

Para o ótimo documentário pernambucano Rio Doce-CDU (linha de ônibus de longo percurso, que liga Olinda a vários bairros do Recife e  à UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) sobraram “migalhas”: uma menção honrosa à fotografia (trabalho de fôlego de Beto Martins!) e som. Para Giovanni Improtta, de José Wilker, filme que tem abertura e desfecho em ritmo de muito samba, mas padece de um roteiro indeciso entre a comédia e o drama social/filme de bicheiro, sobrou a melhor fotografia (Lauro Escorel). Os jurados ignoraram três concorrentes: Aos Ventos que Virão, de Hermano Penna, Mazzaropi, de Celso Sabadin, e Orgulho de Ser Brasileiro, de Adalberto Piotto.

MAZZAROPI (2013), documentário de Celso Sabadin

MAZZAROPI (2013), documentário de Celso Sabadin

Não estou aqui defendendo  reforma agrária de prêmios. Mas recomenda o bom senso que, quando se tem filmes de qualidades semelhantes/equiparadas e nenhuma obra-prima (um Vidas Secas, um Terra em Transe, um Cabra Marcado para Morrer, um O Som ao Redor)  o melhor é buscar em cada concorrente o que ele tem de melhor. Na minha opinião, o estreante Adalberto Piotto (Orgulho de Ser Brasileiro) tem  muito a aprender se quiser somar ao jornalismo (sua profissão) o ofício de cineasta. Não merecia prêmios. Já outro documentário – Mazzaroppi, do também jornalista Celso Sabadin – se peca pela longa duração e por um prólogo muito didático, tem qualidades. A maior delas é a polifonia de depoimentos sobre o Jeca do cinema brasileiro: ator, diretor, produtor, distribuidor e até cantor. Destaque para os depoimentos de Selma Egrei, Ewerton de Castro e David Cardoso! E também para Ronnie Von, Renato Teixeira e Agnaldo Rayol. E pela consistente (e respeitosa) abordagem da homossexualidade do ator-cineasta caipira.

JURI: CONCENTRAÇÃO ABSURDA III

Baixou no júri tamanha paixão pela anárquica (e ao mesmo tempo – como bem lembrou Susana Schild, no debate – apaziguadora/conciliadora) comédia de Betse de Paula, que os 7 aliadores só fizeram meter os pés pelas mãos. Não contentes em dar ao filme os principais prêmios – e os secundários também! – tiveram a pachorra de inventar prêmio (para o ultra-quinhoado Vendo e Alugo). O elenco do filme já estava mais que bem laureado (Marieta Severo, melhor atriz, e Nathalia Thimberg, melhor coadjuvante). Pois não é que deram um prêmio especial às Tartarugas (grupo de atrizes veteranas — Carmen Verônica, Ilka Soares e Daisy Lúcidi)??!!!. Mas se Thimberg também integra a trupe das Tartarugas, por que o prêmio de coadjuvante não foi para as quatro? Acho que o júri comeu, durante a reunião de atribuição dos troféus Calunga, bolo preparado pela estabanada doméstica Graça (vivida por Maria Assunção).

Quem conhece festivais, suas regras e procedimentos, sabe que Prêmio Especial é recurso para laurear um filme de que se gostou muito, mas não tanto quanto o vencedor. Desta vez, os premiadores do CINE PE inovaram: criaram mais prêmio para quem já tinha vencido em praticamente todas as categorias. Quem olhar bem, verá que a Crítica Cinematográfica atribuiu o Prêmio Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) à comédia de Betse. Mas, pelo que soube, os 5 críticos-jurados se dividiram entre Vendo ou Alugo e Rio Doce-CDU (e só tinham um prêmio para atribuir).

O júri popular, composto com 32 espectadores do CINE PE (um modelo que merece muitos elogios, pois colocou fim ao laissez-faire da votação digital, que permitia aos mais espertos votar várias vezes!) elegeu Vendo ou Alugo. O filme tem mesmo pegada popular, elenco muito bom, roteiro movimentado (de uma penca de gente, incluindo José Roberto Torero) e final feliz. Mas está longe das qualidades de nossas grandes comédias (Todas as Mulheres do Mundo, Marvada Carne, Bendito Fruto, etc).

AOS VENTOS QUE VIRÃO (2013), de Hermano Penna

AOS VENTOS QUE VIRÃO (2013), de Hermano Penna

JURI: CONCENTRAÇÃO ABSURDA IV

O juri deve ter odiado Aos Ventos Que Virão, de Hermano Penna. Q0ue pena!!! O filme é irregular, às vezes didático, traz muitos assuntos à tona (o ator Orlando Vieira, parceiro e amigo de Hermano, disse que tem assunto para 5 filmes!), etc. Mas tem, também, momentos arrebatadores. O prólogo, que soma Eisenstein e Os Fuzis (1964, de Ruy Guerra) nos joga num Nordeste em que o Cangaço vive seus estertores (Lampião está morto). O misticismo sofre um baque com a morte do Boi adorado por sertanejos desvalidos. Zé Olímpio (Rui Ricardo Dias), cangaceiro, gravemente ferido, refugia-se num casebre até curar seus males físicos. Quando melhora, casa-se com Lúcia (a cantriz baiana Emanuelle Araújo, de Opaió) e vai para São Paulo, onde torna-se operário da construção civil. Quando regressa ao sertão, tenta eleger-se prefeito de Poço Redondo, sua terra natal, em Sergipe. Não consegue, pois dá-se um  jogo de carta marcada. O final, que envolve Brasília, a cidade que JK e os candangos erguiam no Planalto Central, levanta o filme (assim como o prólogo). Um filme que vai de 1938 (quando morre Lampião) até o finalzinho dos anos 50 (quando Brasília é percebida como a capital da esperança)  necessitava, sim, de mais recursos para uma boa reconstituição de época e figurinos mais convincentes. Mas não ver nenhum mérito no cinema de idéias de Hermano Penna é algo muito preocupante.

 

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